03/05/2010

PSSST!


Fugir a língua para a (in)verdade


Bráctea. Sarrafo. Água-mestra. Fadegénico. Cominar. O que têm estas cinco palavras em comum? Nada. Bem, não é verdade, pois algo as une: pertencem a gírias de profissões, como engenharia civil ou medicina. E se nos dias de hoje há bastante contaminação entre gírias e se é comum encontrarmos palavras específicas num vocabulário generalizado, convém empregá-las sabendo — no mínimo! — o significado e uso das ditas.
Se eu decidir usar ‘fadegénico’, daria jeito saber que é um termo da medicina e que (iuc!) tem a ver com tecidos ulcerados. Posso também impressionar o pessoal, claro, e dizer que fulano é um enorme fadegénico, à guisa de insulto; ficava com um ar muito intelectual, quase erudito, mas mesmo assim não seria compreendida. O que não tem importância alguma, desde que me desse ares de entendida. Não sei se seria cominada pela situação (eu ajudo: ameaçada com pena ou castigo), mas espero bem que não…
O estudo da língua portuguesa também tem a sua gíria; ou jargão. Agradece-se o uso, desde que apropriado. Exemplo simples: pleonasmo. Ou redundância, ou repetição desnecessária, ou superabundância. Acabei de escrever um pleonasmo, mas o meu foi uma figura de estilo, feita de propósito, para reforçar a minha mensagem! Outro exemplo simples: eufemismo. Que é uma figura de linguagem usada para suavizar uma noção desagradável. Se eu disser que algo é uma ‘inverdade’, estou a usar um eufemismo, ou seja, estou a dizer que é uma mentira mas de forma suave (e mais rebuscada…); que sicrano é um amigo do alheio, em vez de ladrão; que o dinheiro não estica, ao invés de… ah, mas esperem, isso não é um eufemismo, é a realidade!

Publicado no Açoriano Oriental a 2 Maio 2010

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